Não é a primeira vez que falo da importância dos espetáculos de dança para o público infanto-juvenil. É fundamental ter uma variedade de linguagens na formação do nosso povo. A cada dia, a lógica técnico-burocrata-empresarial invade e se apossa da educação e da arte e, por isso, é tão urgente produzir e apresentar diversas linguagens artísticas para as crianças e adolescentes. Isso transforma as próximas gerações de espectadores e de artistas.
Esteve em cartaz no Sesc Tijuca, e fará circulação por espaços públicos do Rio (veja Serviço ao final do texto), o espetáculo “A Menina Dança”, que traz texto, dança, canto e instrumentos ao vivo. O tema principal é a jovem Maria Felipa que, nos anos de 1820, liderou a resistência às invasões portuguesas na Bahia. Toda iconografia e literatura que fazem referência a essa personagem histórica estão relacionadas ao litoral (de Itaparica/BA), e a encenação coloca essa questão aquática em evidência desde a entrada do público: uma iluminação azulada com trepidações nas paredes, produz efeito de água. Além disso, há um estandarte encostado na parede que será usado como vela de barco. Tudo isso compõe com a estrutura nua da caixa cênica, revelando as cordas das varas do urdimento, amarradas nas laterais, remetendo a um navio.
O tema, por si só, já é relevante na atualidade brasileira, visto as crescentes militâncias feminista e negra na última década. Mas, para além disso, o público juvenil transforma toda a experiencia: fui em uma apresentação cujo público majoritário era de projeto-escola e os estudantes, antes do terceiro sinal, já estavam batendo palmas no ritmo da música. Mesmo sob os "shhhhh" das professoras - que são obrigadas a estabelecer a ordem. A juventude não se enquadra, não se limita, não se segura. As palmas já deram o impulso do início do espetáculo.
O elenco é responsável por manter essa conexão com a plateia e assim é feito, por meio, sobretudo, das palmas e do canto. O espetáculo também se faz pelo espectador, que dá ritmo e melodia ao teatro, reforçando a noção de acontecimento coletivo. Essa interação por meio da dança e do canto nos coloca num terreno afro-brasileiro. A sonoridade é de maracatu, maculelê, capoeira, samba e jongo. Assim como os músicos, os atores-cantores-bailarinos entregam toda sua energia nessa troca com o público, estão completamente presentes.
A relação entre espaço cênico e figurino é bastante harmônica. De um lado, há a caixa cênica preta sem cenário construído; o espaço negro é colorido por adereços no chão, bem como pelos atores. De outro, o corpo negro do elenco é colorido pelos tecidos extremamente ricos em formas. A volumosa indumentária nos oferece frente e verso. Quando os artistas da cena abrem suas roupas, revelam um interior que não é apenas forro, mas obras de arte porque remetem às pinturas que Abdias Nascimento produziu após seu contato com os Panteras Negras, com a resistência ao apartheid e durante e após seu exílio, no contexto da ditadura militar brasileira.
Não se pode esquecer que a iluminação também está em constante diálogo com essas formas, texturas e cores. Destaco um momento, dentro da globalidade da cena, qual seja, o início. Quando os atores estão entrando em cena pela primeira vez, vemos uma projeção de gobo circular sobre as tábuas do palco. O contraluz é azul e os círculos projetados são dourados. Essas circularidades estabelecem imediatamente um jogo com os círculos de tecido nos figurinos e os tambores da percussão dos músicos.
"A Menina Dança” é um espetáculo necessário para a formação de uma nova consciência sobre nossa história e novas referências culturais.
Ficha Técnica:
Texto, Idealização e Direção de Produção: Paty Lopes
Direção Artística e Coreografia: Flávia Souza
Elenco: Bellas da Silveira, Dani Gomes, Gabriela Luiz, Marcos Bandeira e Tatiana Reis
Percussão: Ivan Karu e Vitor Ligeiro
Figurino: Ricardo Rocha
Desenho de Luz: Valmyr Ferreira
Assistentes na montagem de luz: Brayan Sodre Seguins Nunes, Sol Rosário e Louise
Visagismo: Keila Santos
Direção Executiva: Edison Corrêa
Filmagem: A4 Filmes
Técnica de Luz: Brisa Lima
Técnica de Som: Cynthia Rachel Esperança
Assistente de som: Brenda Fernandes
Fotografia: Valmyr Ferreira
Programação Visual: André Barroso
Assessoria de Imprensa: Alessandra Costa
Assistente de som: Brenda Fernandes
Participação especial na cenografia: Wanderley Gomes
Realização: Eu Rio!
Serviço:
1º de junho - Quadra do Salgueiro - 16 horas
Endereço: Rua Silva Teles 104 Andaraí, Rio de Janeiro
7 de junho - Museu da Maré - 14 horas
8 de junho - Museu da Maré - 17 horas
Endereço: Av. Guilherme Maxwel, 26 - Maré, Rio de Janeiro
14 e 15 de junho - Teatro Ruth de Souza - 11 horas
Endereço: R. Murtinho Nobre, 169 - Santa Teresa, Rio de Janeiro
OBS: Dia 15/06 - Sessão com Audiodescrição e Libras
Classificação indicativa: Livre - a partir de 04 anos
Duração: 45 minutos
Lotação: Sujeito à lotação
Gênero: Infantil
Para retirada de ingressos gratuitos no Salgueiro e no Museu da Maré:
https://www.sympla.com.br/eventos?s=A%20Menina%20Dan%C3%A7a
Para retirada de ingressos gratuitos no Teatro Ruth de Souza:
https://riocultura.eleventickets.com/#!/evento/47ebaaea82bd5d84c3eb217a4173493671e6ad9a